Frases e Citações




“E meu canto é de ninguém. Mas não há paixão sofrida em dor e amor a que não se siga uma aleluia.”
“ Meu tema é o instante? meu tema de vida. Procuro estar a par dele, divido-me milhares de vezes em tantas vezes quanto os instantes que decorrem, fragmentária que sou e precários os momentos - só me comprometo com vida que nasça com o tempo e com ele cresça: só no tempo há espaço para mim.”
“Minhas desequilibradas palavras são o luxo de meu silêncio. Escrevo por acrobáticas e aéreas piruetas - escrevo por profundamente querer falar. Embora escrever só esteja me dando a grande medida do silêncio.”
“E se eu digo "eu" é porque não ouso dizer "tu", ou "nós" ou "uma pessoa", sou obrigada à humildade de me personalizar me apequenando mas sou o és-tu.”
“Inútil querer me classificar: eu simplesmente escapulo não deixando, gênero não me pega mais. Estou em um estado muito novo e verdadeiro, curioso de si mesmo, tão atraente e pessoal a ponto de não poder pintá-lo ou escrevê-lo.”
“Esta é a vida vista pela vida. Posso não ter sentido mas é a mesma falta de sentido que tem a veia que pulsa.”
“Quero escrever-te como quem aprende”
“...em algum lugar ou em algum tempo existe a grande resposta para mim.”
“. Ouve-me, ouve o silêncio. O que eu te falo nunca é o que te falo e sim outra coisa”
“...sufoco porque sou palavra e também o seu eco.”
“Quero a vibração do alegre. Quero a isenção de Mozart. Mas quero também a inconseqüência. Liberdade? é o meu último refúgio, forcei-me à liberdade e agüento-a não como um dom mas com heroísmo: sou heroicamente livre. E quero o fluxo.”
“Eu sou antes, eu sou quase, eu sou nunca.”
“...se eu fosse sólida e forte nem ao menos teria ouvido o ritmo? Não encontro resposta: sou. É isto apenas o que me vem da vida. Mas sou o quê? a resposta é apenas: sou o quê. embora às vezes grite: não quero mais ser eu!! mas eu me grudo a mim e inextricavelmente forma-se uma tessitura de vida.”
“Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível
de fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada.”
“Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios.”
“Sei o que estou fazendo aqui: estou improvisando. Mas que mal tem isso? improviso como no jazz improvisam música, jazz em fúria, improviso diante da platéia.”

“...sou sozinha, eu e minha liberdade. É tamanha a liberdade que pode escandalizar um primitivo mas sei que não te escandalizas com a plenitude que consigo e que é sem fronteiras perceptíveis.’”
“Não sei sobre o que estou escrevendo: sou obscura para mim mesma.”
“Minha aura é mistério de vida. Eu me ultrapasso abdicando de mim e então sou o mundo: sigo a voz do mundo, eu mesma de súbito com voz única.”
“O mundo: um emaranhado de fios teleféricos em eriçamento. E a luminosidade no entanto obscura: esta sou eu diante do mundo.”
“Renuncio a ter um significado”
“Escuta: eu te deixo ser, deixa-me ser então.”
“Escrevo-te porque não me entendo.”
“Nesse âmago tenho a estranha impressão de que não pertenço ao gênero humano.”
“Há muita coisa a dizer que não sei como dizer. Faltam as palavras. Mas recuso-me a inventar novas: as que existem já devem dizer o que se consegue dizer e o que é proibido. E o que é proibido eu adivinho. Se houver força. Atrás do pensamento não há palavras: é-se.”
“Não gosto do que acabo de escrever - mas sou obrigada a aceitar o trecho todo porque ele me aconteceu. E respeito muito o que eu me aconteço. Minha essência é inconsciente de si própria e é por isso que cegamente me obedeço.”
“Agora é um instante. Já é outro agora.”
“Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa....Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso. Lê a energia que está no meu silêncio.”
“Vou parar um pouco porque sei que o Deus é o mundo. É o que existe. Eu rezo para o que existe?”
? “O que mais me emociona é que o que não vejo contudo existe.”
.” E eu tinha resolvido que ia dormir para poder sonhar, estava com saudades das novidades do sonho.”
“Vou te fazer uma confissão: estou um pouco assustada. É que não sei aonde me levará esta minha liberdade. Não é arbitraria nem libertina. Mas estou solta.”
“Eu, que vivo de lado, sou à esquerda de quem entra. E estremece em mim o mundo.”
“...eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro.”
“Sou um coração batendo no mundo.
Você que me lê que me ajude a nascer.”
“O que estou te escrevendo não é para se ler - é para se ser.”
“...não sou um sinônimo - sou o próprio nome.”
“Porque sou uma pergunta.”
“E na minha noite sinto o mal que me domina. O que se chama de bela paisagem não me causa senão cansaço.”
“...nasci dura, heróica, solitária e em pé.”
“A feiúra é o meu estandarte de guerra. Eu amo o feio com um amor de igual para igual. E desafio a morte. Eu - eu sou a minha própria morte. E ninguém vai mais longe. O que há de bárbaro em mim procura o bárbaro cruel fora de mim.”
“Eu amo a minha cruz, a que doloridamente carrego. É o mínimo que posso fazer da minha vida: aceitar comiseravelmente o sacrifício da noite.”
“Quero ser enterrada com o relógio no pulso para que na terra algo possa
pulsar o tempo”
“Se tudo isso existe, então sou eu. mas por que esse mal-estar? É porque não estou vivendo do único medo que se existe para cada um de se viver e nem sei qual é. Desconfortável. Não me sinto bem. Não sei o que é que há. Mas alguma coisa está errada e dá mal-estar. No entanto estou sendo franca e meu jogo é limpo. Abro o jogo. Só não conto os fatos de minha vida: sou secreta por natureza. O que há então? Só sei que não quero a impostura. Recuso-me. Eu me aprofundei mas não acredito em mim porque meu pensamento é inventado.”
“Acho que não vou morrer no instante seguinte porque o médico que me examinou detidamente disse que estou em saúde perfeita. Está vendo? o instante passou e eu não morri.”
“Agora é um instante. Você sente? eu sinto.”
“. Estou pronta para o silêncio grande da morte. Vou dormir.”
“Eu me ultrapasso abdicando de meu nome, e então sou o mundo. Sigo a vozdo mundo com voz única.”
“Nada existe de mais difícil do que entregar-se ao instante. Esta dificuldade é dor humana. É nossa. Eu me entrego em palavras e me entrego quando pinto.”
“Não ter nascido bicho é uma minha secreta nostalgia.”
“Esse ar solto, esse vento que me bate na alma da cara deixando-a ansiada em uma imitação de um angustiante êxtase cada vez novo, novamente e sempre, cada vez o mergulho em alguma coisa sem fundo onde caio sempre caindo sem parar até morrer e adquirir enfim silêncio.”

“Para te escrever eu antes me perfumo toda.”
“Porque não posso mais carregar as dores do mundo. Que fazer quando sinto totalmente o que outras pessoas são e sentem? Vivo-as mas não tenho mais força. Não quero contar nem a mim mesma certas coisas. Seria trair o é-se. Sinto que sei de umas verdades. Que já pressinto. Mas verdades não têm palavras. Verdades ou verdade? Não vou falar no Deus, Ele é segredo meu.”

“Você tornou-se um eu. é tão difícil falar e dizer coisas que não podem ser ditas. É tão silencioso. Como traduzir o silêncio do encontro real entre nós dois? Dificílimo contar: olhei para você fixamente por uns instantes. Tais momentos são meus segredos. Houve o que se chama de comunhão perfeita. Eu chamo isto de estado agudo de felicidade.”
“Precisando mais do que a força humana. Sou forte mas também destrutiva. O Deus tem que vir a mim já que não tenho ido a Ele. Que o Deus venha: por favor. Mesmo que eu não mereça. Venha. Ou talvez os que menos merecem mais precisem. Sou inquieta e áspera e desesperançada. Embora amor dentro de mim eu tenha. Só que não sei usar amor. Às vezes me arranha como se fossem farpas. Se tanto amor dentro de mim recebi e no entanto continuo inquieta é porque preciso que o Deus venha. Venha antes que seja tarde demais. Corro perigo como toda pessoa que vive. E a única coisa que me espera é exatamente o inesperado. Mas sei que terei paz antes da morte e que experimentarei um dia o delicado da vida. Perceberei - assim como se come e se vive o gosto da comida. Minha voz cai no abismo de teu silêncio. Tu me lês em silêncio. Mas nesse ilimitado campo mudo desdobro as asas, livre para viver. então aceito o pior e entro no âmago da morte e para isto estou viva. O âmago sensível. “
“Quero pintar uma rosa.”
“Rosa é a flor feminina que se dá toda e tanto que para ela só resta a alegria de se ter dado. Seu perfume é mistério doido. quando profundamente aspirada toca no fundo íntimo do coração e deixa o interior do corpo inteiro perfumado. O modo de ela se abrir em mulher é belíssimo. As pétalas tem gosto bom na boca - é só experimentar. Mas rosa não é it. É ela. As encarnadas são de grande sensualidade. As brancas são a paz do Deus. É muito raro encontrar na casa de flores rosas brancas. As amarelas são de um alarma alegre. As cor-de-rosa são em geral mais carnudas e têm a cor por excelência. As alaranjadas são produto de enxerto e são sexualmente atraentes.”
“Preste atenção e é um favor: estou convidando você para mudar-se para reino novo.”
“A violeta é introvertida e sua introspecção é profunda. Dizem que se esconde por modéstia. Não é. Esconde-se para poder captar o próprio segredo. Seu quase-não-perfume é glória abafada mas exige da gente que o busque. Não grita nunca o seu perfume. Violeta diz levezas que não se pode dizer.”
“Você há de me perguntar por que tomo conta do mundo. É que nasci incumbida.”
“Não vê que isto aqui é como filho nascendo? Dói. Dor é vida exacerbada. O processo dói. Vir-a-ser é uma lenta e lenta dor boa. É o espreguiçamento amplo até onde a pessoa pode se esticar. E o sangue agradece. Respiro, respiro. O ar é it. Ar com vento já é um ele ou ela. Se eu tivesse que me esforçar para te escrever ia ficar tão triste. Às vezes não agüento a força da inspiração. Então pinto abafado. É tão bom que as coisas não dependam de mim.”

“A coragem de viver: deixo oculto o que precisa ser oculto e precisa irradiar-se em segredo.”
“Calo-me.Porque não sei qual é o meu segredo. Conta-me o teu, ensina-me sobre o secreto de cada um de nós. Não é segredo difamante. É apenas esse isto: segredo.E não tem fórmulas.”
“Fico me assistindo pensar. O que me pergunto é: quem em mim é que está fora até de pensar? Escrevo-te tudo isto pois é um desafio que sou obrigada com humildade a aceitar. Sou assombrada pelos meus fantasmas, pelo que é mítico e fantástico - a vida é sobrenatural.”
“Mas se eu esperar compreender para aceitar as coisas - nunca o ato de entrega se fará. Tenho que dar o mergulho de uma só vez, mergulho que abrange a compreensão e sobretudo a incompreensão. E quem sou eu para ousar pensar? Devo é entregar-me. Como se faz? Sei porém que só andando que se sabe andar e - milagre - se anda.”
“Eu, que fabrico o futuro como uma aranha diligente. E o melhor de mim é quando nada sei e fabrico não sei o quê”
“Como te explicar? Vou tentar. É que estou percebendo uma realidade enviesada. Vista por um corte oblíquo. Só agora pressenti o oblíquo da vida. Antes só via através de cortes retos e paralelos. Não percebia o sonso traço enviesado. Agora adivinho que a vida é outra.”
“Bem sei que há um desencontro leve entre as coisas, elas quase se chocam, há desencontro entre os seres que se perdem uns aos outros entre palavras que quase não dizem mais nada. Mas quase nos entendemos nesse leve desencontro, nesse quase que é a única forma de suportar a vida em cheio, pois um encontro brusco face a face com ela nos assustaria, espaventaria os seus delicados fios de teia de aranha. Nós somos de soslaio para não comprometer o que pressentimos de infinitamente outro nessa vida de que te falo.”
“E eu vivo de lado - lugar onde a luz central não me cresta. E falo bem baixo para que os ouvidos sejam obrigados a ficar atentos e a me ouvir.”
“Eu, que corro nervosa e só a realidade me delimita.”
“E eis que sinto que em breve nos separaremos. Minha verdade espantada é que eu sempre estive só de ti e não sabia. Agora sei: sou só. Eu e minha liberdade que não sei usar. Grande responsabilidade da solidão. Quem não é perdido não conhece a liberdade e não a ama. Quanto a mim, assumo a minha solidão. Que às vezes se extasia como diante de fogos de artifício. Sou só e tenho que viver uma certa glória íntima que na solidão pode se tornar dor. E a dor, silêncio. Guardo o seu nome em segredo. Preciso de segredos para viver.”
“Escrevo-te em desordem, bem sei. Mas é como vivo. Eu só trabalho com achados e perdidos.”
“. Sou aos poucos. Minha história é viver. E não tenho medo do fracasso. Que o fracasso me aniquile, quero a glória de cair. Meu anjo aleijado que se desajeita esquivo, meu anjo que caiu do céu para o inferno onde vive gozando o mal.”

“E não te falarei sequer nisso que escrevo e que contém o que sou e que te dou de presente sem que o leias. Nunca lerás o que escrevo. E quando eu tiver anotado o meu segredo de ser -jogarei fora como se fosse ao mar. Escrevo-te porque não chegas a aceitar o que sou. Quando destruir minhas anotações de instantes, voltarei para o meu nada de onde tirei um tudo? Tenho que pagar o preço. O preço de quem tem um passado que só se renova com paixão no estranho presente. Quando penso no que já vivi me parece que fui deixando meus corpos pelos caminhos.”
“Corto a dor do que te escrevo e dou-te minha inquieta alegria.”
“E neste instante-já vejo estátuas brancas espraiadas na perspectiva das distâncias longas do longe - cada vez mais longe no deserto onde me perco com olhar vazio, eu mesma estátua a ser vista de longe, eu que estou sempre me perdendo. Estou fruindo o que existe. Calada, aérea, no meu grande sonho. Como nada entendo - então adiro à vacilante realidade móvel. O real eu atinjo através do sonho. Eu te invento, realidade.”
.” Mas sou tabu para mim mesma, intocável porque proibida”
“Ah a Força do que Existe, ajudai-me, vós que chamam de o Deus. Por que é que o horrível terrível me chama? que quero com o horror meu? porque meu demônio é assassino e não teme o castigo: mas o crime é mais importante que o castigo. Eu me vivif ico toda na meu instinto feliz de destruição.”
“Luto para não transpor o portal. São muros de um Cristo que está ausente, mas os muros estão ali e são tocáveis: pois as mãos também olham. “
Mas agora estou interessada pelo mistério do espelho. Procuro um meio de pintá-lo ou falar dele com a palavra. Mas o que é um espelho? Não existe a palavra espelho, só existem espelhos, pois um único é uma infinidade de espelhos.”
“E mal posso falar, de tanto silêncio desdobrado em outros.”
“Espelho? Esse vazio cristalizado que tem dentro de si espaço para se ir para sempre em frente sem parar: pois espelho é o espaço mais fundo que existe. E é coisa mágica: quem tem um pedaço quebrado já poderia ir com ele meditar no deserto. Ver-se a si mesmo é extraordinário. Como um gato de dorso arrepiado, arrepio-me diante de mim. No deserto também voltaria vazia, iluminada e translúcida, e com o mesmo silêncio vibrante de um espelho.”
Espelho é luz. Um pedaço mínimo de espelho é sempre um espelho todo.Tire-se a sua moldura ou a linha de seu recortado, e ele cresce assim como água se derrama.”
“O que é um espelho? É o único material inventado que é natural. Quem olha um espelho, quem consegue vê-lo sem se ver, quem entende que a sua profundidade consiste em ele ser vazio, quem caminha para dentro de seu espaço transparente sem deixar nele o vestígio da própria imagem - esse alguém então percebeu o seu mistério de coisa.”
“Não, eu não descrevi o espelho - eu fui ele. E as palavras são elas mesmas, sem tom de discurso.”


“Tenho que interromper para dizer que "X" é o que existe dentro de mim. "X" - eu me banho nesse isto. É impronunciável. Tudo que não sei está em "X". A morte? a morte é "X". Mas muita vida também pois a vida é impronunciável. "X" que estremece em mim e tenho medo de seu diapasão: vibra como uma corda de violoncelo, corda tensa que quando é tangida emite eletricidade pura, sem melodia. O instante impronunciável. Uma sensibilidade outra é que se apercebe de "X".”
“. Cada um de nós é um símbolo que lida com símbolos - tudo ponto de apenas referência ao real. Procuramos desesperadamente encontrar uma identidade própria e a identidade do real. E se nos entendemos através do símbolo é porque temos os mesmos símbolos e a mesma experiência da coisa em si: mas a realidade não tem sinônimos.”
“Sei que depois de me leres é difícil reproduzir de ouvido a minha música, não é possível cantá-la sem tê-la decorado. E como decorar uma coisa que não tem história?”
“. Mas quero ter a liberdade de dizer coisas sem nexo como profunda forma de te atingir. Só o errado me atrai, e amo o pecado, a flor do pecado.”
“Sinta-se bem. Eu na minha solidão quase vou explodir. Morrer deve ser uma muda explosão interna. O corpo não agüenta mais ser corpo. E se morrer tiver o gosto de comida quando se está com muita fome? E se morrer for um prazer, egoísta prazer?”
“Sim, o que te escrevo não é de ninguém. E essa liberdade de ninguém é muito perigosa. É como o infinito que tem cor de ar.”
“Isto tudo que estou escrevendo é tão quente como um ovo quente que a gente passa depressa de uma mão para a outra e de novo da outra para a primeira a fim de não se queimar - já pintei um ovo. E agora como na pintura só digo: ovo e basta.”
“Não, nunca fui moderna. E acontece o seguinte: quando estranho uma pintura é aí que é pintura. E quando estranho a palavra é aí que ela alcança o sentido. E quando estranho a vida aí é que começa a vida. Tomo conta para não me ultrapassar. Há nisto tudo aqui grande contenção. E então fico triste só para descansar. Chego a chorar manso de tristeza. Depois levanto e de novo recomeço. Só não te contaria agora uma história porque no caso seria prostituição. E não escrevo para te agradar.”
“Agora te escreverei tudo que me vier à mente com o menor policiamento possível. É que me sinto atraída pelo desconhecido. Mas enquanto eu tiver a mim não estarei só.”
“Ah se eu sei que era assim eu não nascia. Ah se eu sei eu não nascia. A loucura é vizinha da mais cruel sensatez. Isto é uma tempestade de cérebro e uma frase mal tem a ver com outra. Engulo a loucura que não é loucura - é outra coisa. Você me entende? Mas vou ter que parar porque estou tão e tão cansada que só morrer me tiraria deste cansaço.”



“Diga-me por favor que horas são para eu saber que estou vivendo nesta hora. Estou me encontrando comigo mesma: é mortal porque só a morte me conclui. Mas eu agüento até o fim. Vou lhe contar um segredo: a vida é mortal. Vou ter que interromper tudo para te dizer o seguinte: a morte é o impossível e o intangível. De tal forma a morte é apenas futura que há quem não a agüente e se suicide.”
“Mas se não compreendo o que escrevo a culpa não é minha. Tenho que falar porque falar salva. Mas não tenho nenhuma palavra a dizer. O que é que na loucura da franqueza uma pessoa diria a si mesma? Mas seria a salvação”.
“Que silêncio. "Deus" é de um tal enorme silêncio que me aterroriza.”
“O que sou neste instante? sou uma máquina de escrever fazendo ecoar as teclas secas na úmida e escura madrugada. Há muito já não sou gente. Quiseram que eu fosse um objeto. Sou um objeto. Que cria outros objetos e a máquina cria a nós todos. Ela exige. O mecanismo exige e exige a minha vida. Mas eu não obedeço totalmente: se tenho que ser um objeto, que seja um objeto que grita. Há uma coisa dentro de mim que dói. Ah como dói e como grita pedindo socorro. Mas faltam lágrimas na máquina que sou. Sou um objeto sem destino. sou um objeto nas mãos de quem? tal é o meu destino humano. O que me salva é grito. Eu protesto em nome do que está dentro do objeto atrás do atrás do pensamento-sentimento. Sou um objeto urgente.”
“O estado de graça de que falo não é usado para nada. é como se viesse apenas para que se soubesse que realmente se existe e existe o mundo. Nesse estado, além da tranqüila felicidade que se irradia de pessoas e coisas, há uma lucidez que só chamo de leve porque na graça tudo é tão leve. É uma lucidez de quem não precisa mais adivinhar: sem esforço, sabe. Apenas isto: sabe. Não me pergunte o quê, porque só posso responder do mesmo modo: sabe-se.”
“Quando se vê, o ato de ver não tem forma - o que se vê às vezes tem forma, às vezes não. O ato de ver é inefável. E às vezes o que é visto também é inefável”
“ O verdadeiro pensamento parece sem autor.”
“...poderia dizer "tudo". Mas "tudo" é quantidade, e quantidade tem limite no seu próprio começo”
“E Deus é uma criação monstruosa. Eu tenho medo de Deus porque ele é total demais para o meu tamanho. E também tenho uma espécie de pudor em relação a Ele: há coisas minhas que nem Ele sabe. Medo? Conheço um ela que se apavora com borboletas como se estas fossem sobrenaturais. E a parte divina das borboletas é mesmo de dar terror. E conheço um ele que se arrepia todo de horror diante de flores - acha que as flores são assombradamente delicadas como um suspiro de ninguém no escuro.”
“Eu é que estou escutando o assobio no escuro. Eu que sou doente da condição humana. Eu me revolto: não quero mais ser gente”



“Mas eu denuncio. Denuncio nossa fraqueza, denuncio o horror alucinante de morrer - e respondo a toda essa infâmia com - exatamente isto que vai agora ficar escrito - e respondo a toda essa infâmia com alegria. Puríssima e levíssima alegria. A minha única salvação é a alegria. Uma alegria atonal dentro do it essencial. Não faz sentido? Pois tem que fazer. Porque é cruel demais saber que a vida é única e que não temos como garantia senão a fé em trevas -porque é cruel demais, então respondo com a pureza de uma alegria indomável. Recuso-me a ficar triste. Quem não tiver medo de ficar alegre e experimentar uma só vez sequer a alegria doida e profunda terá o melhor de nossa verdade.”


“Aliás não quero morrer. Recuso-me contra "Deus". Vamos não morrer como desafio?
“Não vou morrer, ouviu, Deus? Não tenho coragem, ouviu? Porque é uma infâmia nascer para morrer não se sabe quando nem onde. Vou ficar muito alegre, ouviu? Como resposta, como insulto. Uma coisa eu garanto: nós não somos culpados. E preciso entender enquanto estou viva, ouviu? porque depois será tarde demais.”
“Sou herege. Não, não é verdade. Ou sou? Mas algo existe.”
“Ah viver é tão desconfortável. Tudo aperta: o corpo exige, o espírito não pára, viver parece ter sono e não poder dormir - viver é incômodo. Não se pode andar nu nem de corpo nem de espírito.”
“Eu não te disse que viver é apertado? Pois fui dormir e sonhei que te escrevia um largo majestoso e era mais verdade ainda do que te escrevo: era sem medo. Esqueci-me do que no sonho escrevi, tudo voltou para o nada, voltou para a Força do que Existe e que se chama às vezes Deus.”
“Tudo acaba mas o que te escrevo continua. O que é bom, muito bom. O melhor ainda não foi escrito. O melhor está nas entrelinhas.”
“Simplesmente eu sou eu. e você é você. É vasto, vai durar.
O que te escrevo é um "isto". Não vai parar: continua.
Olha para mim e me ama. Não: tu olhas para ti e te amas. É o que está certo.
O que te escrevo continua e estou enfeitiçada.”